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quarta-feira, 1 de agosto de 2012

Protocolo do percurso para conhecer Robert Wilson


Glauber Gonçalves de Abreu

Verdadeiramente, não conhecia Robert Wilson. Talvez por uma questão local de recorte do cânone, minha graduação em teatro não contemplou suas obras, sua trajetória e seus procedimentos criativos nas diversas aulas de história, teoria e interpretação. As impressões sobre o artista vinham de rápidas pinceladas em aulas de técnicas teatrais, pesquisas autônomas na internet, leituras, revista Bravo; impressões mais vinculadas à forma que ao processo. Teciam-se comentários acerca de um teatro frio, pouco vertiginoso, pouco dionisíaco – “que é trazido a nós, o mais de perto possível, pela analogia da embriaguez” (NIETZSCHE, 2003: 30). Fragmentos de um Apolo exacerbado e desmedido, preso aos efeitos da forma. Foi com esse olhar que cheguei ao primeiro módulo da disciplina Encenações em Jogo: experimentos de criação e aprendizagem do teatro contemporâneo, cujo modelo estético posto em jogo inicialmente foi o criador Robert Wilson. Reitero a denominação de Wilson como criador por entender que seus domínios criativos colocam em questão – e em movimento – as fronteiras do que chamaríamos de teatro. O próprio conceito de “teatro pós-dramático”, elaborado por Hans-Thies Lehmann e presente em boa parte de nossas discussões em sala, apóia-se bastante nas obras de Wilson para se desenhar. O desejo de compreender conceitualmente e verbalizar a experiência deste novo teatro (LEHMANN, 2007: 22), tendo Wilson como um dos seus principais expoentes, é justamente o que mobiliza a busca deste conceito, que tenta dar conta das novas configurações formais e processuais do Teatro.

É curioso e me movimenta pensar efetivamente porque Bob foi incorporado ao cânone teatral. O filme-documentário a que assistimos, Absolute Wilson, deixa claro que Bob não inicia sua carreira artística exatamente como um artista de teatro. Vemos no filme que, quando de suas primeiras apresentações em Nova York, um jornal local do Texas (estado natal de Wilson) escreve que a arte, o cinema ou a arquitetura devem ter um lugar para ele. Me pergunto muito porque o teatro não fora citado e – mais do que isso – porque o teatro é quem havia expandido suas fronteiras, territórios e limites para fazer caber Bob? Não seria possível um novo cinema, de limites rompidos entre a tele presença e a presença real? Uma nova arte, mais viva, mais tridimensional, mais calorosa, em movimento, ao contrário da escultura estática? Uma nova dança, mais teatral (como Pina Bausch faria alguns anos mais tarde)? Uma arquitetura em trânsito? Como Bob chegaria ao teatro?

O contato com o filme foi fundamental para conhecer melhor o artista e seu processo de criação. A impressão fria que pairava sobre sua obra aos poucos se desintegrou em seus múltiplos sentidos e princípios criativos. O encontro com o outro transformou a maneira de fazer e pensar arte em  Bob Wilson. O silêncio, a ausência, o vazio, a dilatação do tempo são perspectivas de olhar sobre o mundo. Impossível não estabelecer relações entre esses procedimentos e seu encontro com crianças autistas, com Christopher Knowles ou com o surdo Raymond Andrews. A presença de seres humanos especiais e suas limitações de percepção parecem fazer Bob repensar o alcance da linguagem verbal – e da linguagem, propriamente – e levar ao palco espetáculos de enorme potência imagética, em que a palavra ocupa um outro lugar, fora da lógica textocêntrica.

A dimensão pós-dramática de seu trabalho fica clara pela incorporação dos diversos procedimentos que detectamos: descontinuidade de ação e da narrativa, coralidade, simultaneidade, musicalização da cena, dilatação do tempo, atmosfera onírica, disjunção entre gesto e música, “dramaturgia da luz”, presença de elementos visuais (linhas, formas, cores) na composição do espaço.  Como a disciplina possui caráter teórico-prático, após identificar os procedimentos, experimentamo-los. Na primeira experimentação, em formato de roteiro cênico ilustrado ou story board, essencialmente visual, parti de uma imagem descrita por GALIZIA (2005: 92) para ilustrar a ideia de teatro estático em uma mostra realizada em Paris na década de 1970:

As duas Cadeiras Vitorianas de madeira que faziam par também receberam um tratamento dramático especial: um conjunto de faróis dianteiros na extremidade do espaldar e nos quatro pés de cada cadeira e a fiação permanece descoberta, no chão. As cadeiras foram colocadas a uma distancia aproximada de trinta metros, uma diante da outra, sobre uma superfície semelhante a um espelho. A tensão existente entre as duas cadeiras transcendia, pelo menos até certo ponto, a vulnerabilidade da ilusão do significado.

 A tensão provocada pela iminência do movimento ou da ocupação presente nessa descrição me colocou em contato com o próprio estado do ser humano, sempre potencial, em constante devir. O que existe nesta imagem é “a possibilidade do teatro” (94), a possibilidade de que o ser humano se faça presente e, portanto, um novo conceito de ação. Este conceito marca também teatralidade presente no cotidiano. A presença, aqui, se dá pela ausência, como no centro da cidade aos domingos (que é pura possibilidade).

FIGURA 1. Primeira imagem do roteiro cênico inspirado em Bob Wilson.
FIGURA 2. Rua 25 de Março (SP) em potência.
Fonte: 
http://fotos.estadao.com.br/cidades-sao-paulo-vazia-regiao-da-rua-25-de-marco-durante-o-jogo-entre-brasil-e-portugal,galeria,,108545,,9,0.htm?pPosicaoFoto=38

FIGURA 3. Rua 25 de Março (SP) ocupada.
Fonte:
http://www.flickr.com/photos/f_prestes/2428341680/

Depois, fizemos as improvisações, os coros wilsonianos, trabalhando alguns dos procedimentos identificados em que um corifeu liderava a movimentação dos demais participantes. Para finalizar o módulo, criamos uma cena em grupo a partir dos roteiros cênicos individuais. Interessante perceber como o procedimento ressoa diferente se deixa de ser exclusivamente mental e passa pelo corpo como um todo. PUPO (2010: 12) já afirmaria que “o grande poder do teatro (...) está no fato de que só dentro dele que eu tenho condição de, corporalmente, assumir um mundo fictício”. Faço este protocolo após ter tido a oportunidade de experimentar com um grupo de alunos da educação à distancia esse jogo de citação cênica a partir de um espetáculo do Antunes Filho apresentado em Brasília. A experiência foi muito potente em termos didáticos e ampliou enormemente o tipo de relação que se estabeleceu com a obra e a compreensão de seus sentidos. A leitura que os estudantes fizeram do espetáculo se ampliou na dimensão simbólica e também no estabelecimento de vínculos pessoais com o trabalho. Como facilitador, o meu próprio olhar sobre o espetáculo foi redimensionado a partir das reverberações dos procedimentos de criação nos corpos dos alunos.

FIGURA 4. Estudante em jogo. Brasília, julho/2012.
O contato com outros materiais, especialmente trechos em DVD dos espetáculos, contribuiu enormemente para o conhecimento da obra do artista estudado e apontou a constituição de uma ferramenta muito potente, inclusive, para o professor de teatro da educação básica. Escrevo minha dissertação sobre formação de espectadores e conheço as dificuldades logísticas do acesso de estudantes a espetáculos de teatro. Por meio do registro do espetáculo em DVD foi possível identificar os princípios e procedimentos, a ocupação do espaço, a relação entre os atores, a utilização do tempo, a proposta sonora, o curso da narrativa. Interessante pensar os desdobramentos didáticos do registro filmado de uma peça. 

Posso dizer que admiro este criador como não fazia antes. Ou, pelo menos, que entendo melhor como ele se encaminha para suas obras e acho interessante como suas propostas abalaram o próprio conceito de teatro. Fico curioso e na expectativa para um possível encontro em que serei plateia ao vivo de uma obra de Wilson (ingressos esgotados para o Beckett no SESC Belenzinho).

REFERÊNCIAS

GALIZIA, Luiz Roberto. Os processos criativos de Robert Wilson. São Paulo: Editora Perspectiva, 2005.
LEHMANN, Hans-Thies. Teatro pós-dramático. São Paulo: Cosac&Naify, 2007.
NIETZSCHE, Friedrich. O nascimento da tragédia ou helenismo e pessimismo. São Paulo: Companhia das Letras, 2003.
PUPO, Maria Lúcia. Teatro e Educação Formal. In: CORADESQUI, Glauber (Org.). Teatro na Escola: experiências e olhares. Brasília: Fundação Athos Bulcão, 2010.



A ORDENAÇÃO DO CAOS


                                                       A ORDENAÇÃO DO CAOS
                                                                                                                  Por: Francis Wilker




Para começar pelo começo, acho importante dizer que a obra de Bob Wilson nunca tinha despertado meu interesse. Guardava para mim esse nome associado à ideia de elitismo, artificialidade, ostentação....Desse modo, a oportunidade de conhecer melhor o artista e sua obra na disciplina Encenações em Jogo foi uma rica oportunidade de aprender e rever preconceitos...a prova de que o conhecimento é o melhor antídoto contra o preconceito e a ignorância (aqui no sentido de falta de conhecimento mesmo).
De início a proposta do professor Marcos Bulhões em trabalharmos com Roteiros Cênicos se mostrou bastante instigante. Como diretor/encenador pouquíssimas vezes fiz uso dessa “ferramenta” de “planejamento” da encenação. Essa estratégia ao mesmo tempo ajudou a me aproximar do universo do artista que estava sendo estudado e também me fez pensar em outras possibilidades para o meu trabalho como encenador, uma vez que achei bastante produtiva a elaboração dos roteiros, tanto como estímulo criativo quanto como um modo possível de pensar a elaboração/estudo de uma encenação.
O estudo do documentário Absolute Wilson foi fundamental para ter uma noção da trajetória do artista: origem, formação, influências, características, etc. Nesse ponto me chamou a atenção dois aspectos principais:
1)      o interesse e o trabalho de Bob com crianças/pessoas com problemas mentais (seja em relação à fala, à cognição ou motora). O encontro com essas aparentes limitações parece ter sido o grande disparador que resultou em aspectos importantes de sua poética. Além disso, o próprio Wilson apresentava dificuldades de fala quando criança. É interessante pensar como a limitação age no trabalho artístico gerando novas respostas e modos de expressar o mundo. Pensar em procedimentos como disjunção entre gesto e fala; dilatação do tempo; formas de trabalhar um texto; narrativas não lineares, entre outros, ganham novo sentido após conhecer essa trajetória.
2)      As suas experiências formativas que envolvem as artes visuais, o happening, a dança, o teatro, a arquitetura. Isso ajuda a entender como Bob se posicionou logo de início numa zona de criação absolutamente híbrida.
O impacto dessas dimensões na sua poética pode ser exemplificado na descrição do seu trabalho apresentada no texto de introdução de uma entrevista com o encenador e, em seguida, com um trecho onde o próprio Bob fala de suas criações:

“Rejeitando as facetas mais conservadoras da prática do teatro, ao enfatizar a qualidade pictórica da composição de palco, suas peças do final dos anos 60 criaram uma fusão caleidoscópica de elementos de palco: camadas multiespaciais e temporais desdobrando-se em uma longa duração de tempo, e questionando a idolatria da palavra que dominou o teatro ocidental desde a Renascença.”[1]

“Para mim, é tudo ópera e é ópera no sentido latino da palavra, que significa trabalho: e isto significa algo. Eu escuto, é alguma coisa que eu vejo, é algo que eu cheiro. Isto inclui arquitetura, pintura, escultura e luzes: todas as artes estão na ópera. De uma certa maneira, todos os meus trabalhos são óperas , no sentido da palavra em latim, que significa “opus”.”[2]

Entre os parceiros recorrentes de Wilson destaca-se o músico e compositor Philip Glass que colaborou em diversas montagens. Veja uma das composições no link:

Depois de conhecer melhor aspectos do seu trabalho, assistir ao espetáculo A Última Gravação de Krapp, onde o próprio Bob Wilson está em cena, foi uma experiência diferenciada. Ali, me relacionando ao vivo com a matéria de sua arte, me chamou a atenção o apuro visual da cena, há uma preocupação singular com acabamento de cenários e objetos, sua distribuição no palco e a composição dessas visualidades de modo geral. Outro aspecto que impressiona é o modo como a iluminação se configura, há aqui uma precisão e ao mesmo tempo uma sutileza – como a passagem de tempo expressa pela luz que vaza da janela – a sensação é de que a luz é como um ator no espetáculo.
Por último, a experimentação prática dos principais procedimentos discutidos pela turma foi um terreno fértil de possibilidades. Interessante notar como em pouco tempo tantas imagens potentes foram criadas, experimentos simples a partir dos roteiros e que exploraram relações com o tempo, o espaço, elementos visuais...como pode ser visto no link abaixo que contém o registro das experimentações do grupo que integrei:

De modo geral, esses são os principais aspectos que me chamaram a atenção durante o módulo Bob Wilson. Seja no trabalho como professor e/ou encenador (em mim esses dois aspectos parecem não se separar) se mostrou estruturante analisar obras teatrais/encenadores procurando identificar procedimentos utilizados, discutir sobre os mesmos e em seguida experimentá-los e observar como se desdobram em outros corpos, com outras memórias, em outra cultura...


[1] Texto de apresentação da entrevista com Robert Wilson in HERITAGE, Paul; DELGADO Maria M. Diálogos no Palco. Rio de Janeiro: Livraria Francisco Alves Editora S.A, 1999.
[2] Idem. Pág.535.
* Foto: montagem do autor e fotografia de Carmven.

domingo, 29 de julho de 2012

Protocolo Bob Wilson - Laila Padovan


Protocolo Bob Wilson

Nome: Laila Padovan
Disciplina: Encenações em Jogo

            Durante as aulas destinadas a Bob Wilson, fui gradualmente sendo envolvida por um universo bem particular e peculiar a que Bob Wilson nos convida a vivenciar; e me surpreendi positivamente com a riqueza de seu trabalho e com sua audácia em propôr uma forma de realizar o teatro que incluia várias outras manifestações artísticas, como a dança, a ópera, a música, as artes plásticas, a arquitetura, poesia, etc. Todas essas modalidades artísticas pareciam ser tratadas de forma independente e pura, ao mesmo tempo em que eram deslocadas de seu contexto ou funcionalidade tradicionais para serem inseridas em uma obra em que elas apareciam justapostas, embaralhadas, coladas. Uma obra de arte total.
            Um dos pontos que mais me interessou na sua obra foi a possibilidade de conduzir, tanto os próprios atores-bailarinos-cantores quanto os espectadores, a uma percepção alterada do mundo. Como que num sonho, Bob Wilson nos transporta para uma dimensão com outro tempo (através, por exemplo, de seus espetáculos bastante longos e dos movimentos em câmera lenta), com outro espaço (através, por exemplo, de justaposições, colagens, formas de iluminação, trazendo elementos da arquitetura e das artes plásticas) e com figuras cênicas estranhas (através, por exemplo, de figurinos meio animal, meio humano, de uma maquiagem branca e pálida ou de movimentos estilizados).
            O espectador parece assim estar assistindo a uma paisagem em movimento, num mundo onírico, entre o sono e a vigília, entrando em um estado alterado na qual pode começar a perceber imagens, sons, sensações, pensamentos, muito diferentes daqueles que experimenta em sua vida cotidiana. A inexistência de uma história a ser contada nos remete a um modo da existência humana distante de nossa compreensão racional e linear e que aponta para múltiplos sentidos e significados às vezes até incompreensíveis e extraordinários.

   “O que acontece na realidade é um equilíbrio de ritmos. Sendo a imagem exterior lenta, o olho apreende com maior rapidez o que é visto. As imagens exteriores e interiores começam a ajustar-se umas às outras e a imaginação de quem vê caminha com velocidade cada vez maior. Habitualmente o mundo exterior desenvolve-se com rapidez excessiva para que o ser humano tenha tempo de pensar no que está se desenvolvendo em sua mente, em relação àquilo que está acontecendo. No teatro de Wilson, a platéia goza de um tempo a mais. Essa combinação de piscar e dormir é fundamental para a experiência do espectador.” (GALIZIA, 2005, p.154)

            As experiências práticas realizadas na disciplina foram bastante interessantes para mim pois pude experimentar formas de criação bastante diferentes das que eu costumo empregar em meu trabalho artístico. A execução dos Roteiros Cênicos foi uma experiência reveladora. Através de imagens que vinham espontaneamente em minha mente, pude aos poucos organizá-las, experimentando uma sensação de certa liberdade em misturá-las, utilizando alguns dos procedimentos do Bob Wilson como a justaposição, a colagem, o deslocamento, etc. E o resultado final das cenas realizadas em grupo foi lindo!!!! Muitas imagens realmente poéticas e ricas.

Bibliografia:
GALIZIA, Luiz Roberto. Os processos criativos de Robert Wilson. São Paulo, Editora Perspectiva, 2005.
LEHMANN, Hans-Thies. O teatro pós-dramático. São Paulo, Cosac&Naify, 2007.
MERLEAU-PONTY, Maurice. Fenomenologia da Percepção. São Paulo. Martins Fontes, 2011.






segunda-feira, 2 de julho de 2012

03/07/2012 Protocólo Bob Wilson/ Flávia Junqueira




Começar a participar do módulo Bob Wilson, o primeiro módulo de nossa disciplina, foi o ponto inicial para me deparar com o universo do Teatro de modo verdadeiramente real. Apesar de já conhecer um pouco do universo teatral quando trabalhava com cenografia há uns 3 ou 4 anos atrás, eu raramente me envolvia com o processo estético embutido na própria dramaturgia da atuação e encenação.

Participar dessas aulas foi o inicio para perceber o quão é complexa a tarefa de ser ator e atuar. Neste texto conto um pouco de minha relação com esse primeiro módulo: minhas impressões gerais pessoais, as constatações dos processos estéticos de Bob Wilson e sua relações com as Artes Plásticas (disciplina de minha formação)e por fim, apresento algumas imagens de projetos e trabalhos apresentados para a aula.

Inicialmente, nas primeiras aulas, pediu-se que fosse realizado um roteiro de tema livre para uma encenação. Escolhi realizar o roteiro de um casamento, já que meu projeto de mestrado trata de entender os aspectos estéticos de teatralidade presente em nossa realidade cotidiana.

Fiz alguns desenhos e achei interessante participar das práticas que implicavam esses projetos  iniciais. Nas práticas juntávamos nosso roteiro pessoal a um processo estético de Bob Wilson e a partir deste duplo pensamento, formávamos um terceiro movimento, que em grupo era apresentado.

Achei bastante interessante o processo de aproximação a Bob Wilson, fizemos roteiros, desenhos, projetos, repetições de encenação em prática, analisamos recortes, recursos, falamos muito sobre quais eram os processos estéticos vendo os filmes das peças de Bob e principalmente tivemos a grande oportunidade de assistir ao vivo a peça de Bob Wilson, encenada pelo próprio artista criador, que na ocasião da época do módulo, se apresentava no SESC, com a peça A ÚLTIMA GRAVAÇÃO DE KRAPP (Krapp´s Last Tape).

Ver a peça após todo esse conhecimento foi fundamental para entender os limites racionais e intencionais de Bob, e como todos os recortes eram de fato processos fortemente demarcados e reconhecíveis ao longo de sua carreira.


Uma das coisa que mais me comovi nas aulas sobre Bob Wilson, foi  assistir o documentário sobre a trajetória do artista. Me sensibiliza, muitas vezes, olhar a história de um artista, entender quais foram seus percursos, seus maiores problemas e constatar como que tudo que é verdadeiramente desejável por alguém, de fato acontece quando há persistência unida a qualidade e muita crença.

O documentário, me sensibilizou e me fez notar como os processo estéticos de Bob se desenvolveram pouco a pouco até hoje. Ver como o interesse de um artista gera possibilidades de desencadeamento para sua efetiva produção, é realmente muito intrigante para jovens artista como eu.

Além desses pontos que apresentei, que até agora foram apenas juízos de gosto pessoal, gostaria também de apontar para um elemento de aproximação do Teatro Performático com as Artes Plásticas. Ao estudar Bob Wilson, pude perceber o quanto esses processos estéticos embutidos neste tipo de Teatro são reconhecíveis no universo de criação da Arte Contemporânea.

O mais interessante foi notar, que para além dessa constatação, o mais curioso era o fato de que nas Artes Plásticas esses processos estéticos são comuns, batidos e normais. Como o próprio professor Bulhões nos suscitou em aula como dúvida; foi refletir sobre a dificuldade pelos quais o espectador teatral ainda não está apto a reconhecer com conforto e fácil identificação processos estéticos performáticos do Teatro Contemporâneo.

Digo isso e gostaria de reforçar essa constatação, pois processos estéticos como: prolongamento do tempo, recorte de luz, silêncio,  imagem artificial como representação estética do que "dever ser",  dureza do controle racional,  som prolongado e estranho, desconexões de ações, etc.; são processo estéticos usados na Arte Contemporânea.

 Tais processos, inseridos neste contexto, não só são bem assimilados, como passam a ser quase uma "regra", sendo que o contrário, por exemplos, se imaginarmos os recursos estéticos do Teatro Dramático, (exemplo a narrativa) se fossem utilizados aleatoriamente nas Artes Plásticas, seriam automaticamente abominados e recusáveis (exceto claro, se fossem utilizados a favor de um conceito específico para o valor de definição de um trabalho plástico determinado.)

Tal dicotomia me fez pensar os motivos pelos quais isso acontece, e de certo modo, a única resposta que tenho até agora e imaginar que como o Teatro acontece em tempo real e "exige" a presença 100% do espectador e as Artes Plásticas muitas vezes não. (isso porque, por exemplo, um trabalho de vídeo com duração de 10m de silencio inicial, pode ser largado pelo espectador nos seus primeiros segundos,neste caso, o espectador simplesmente para de ver e vai olhar o próximo trabalho dentro da exposição.)

Já o Teatro não, ele parece "atar" o corpo da pessoa na poltrona, que com a luz escura se sente aflito ao esperar os 10m de silencio e imobilidade e é "coagido" a permanecer  e esperar ali sozinho. Poucos espectadores em uma situação como essa levantariam e iriam embora, ou não?

Pensar sobre isso me faz lembrar os vídeos do artista contemporâneo Matthew Barney, que usa muitos dos mesmos procedimentos estéticos em seus trabalhos.

Matthew Barney

Robert Wilson


Para concluir gostaria de citar dois aspectos que me foram marcantes nessas aulas sobre Bob Wilson. Primeiro ler o texto da Feral, em que encontrei nas referencias bibliografias do texto, outras referencias cruciais para entender as relações entre teatralidade e realidade, pontos que identifico para a construção de minha dissertação de mestrado.

Em um segundo aspecto, notei um grande controle que os atores que fazem parte de nosso curso (os alunos de nossa disciplina) tem um grande domínio de seu próprio corpo, algo que eu como Artista Plástica não consigo me adaptar e nem desenvolver, mas admiro muito.

A baixo, apresento uma foto do trabalho de meu grupo para a construção prática baseado nos processos estéticos do módulo Bob Wilson.



segunda-feira, 11 de junho de 2012

Protocolo Bob Wilson - LFBongiovanni




















“Words for Bob are like tacks on the kitchen floor in the dark of night and you’re barefoot. So Bob clears a path he can walk through words without getting hurt. Bob changes the values and shapes of words. In some sense they take on more meaning; in some cases, less.” (qtd. in Holmberg 43).
“The way actors are trained here is wrong. All they think about is interpreting a text. They worry about how to speak words and know nothing about their bodies. You see that by the way they walk. They don’t understand the weight of a gesture in space. A good actor can command an audience by moving one finger” (qtd. in Holmberg 49).
“I do movement before we work on the text. Later we’ll put text and movement together. I do movement first to make sure it’s strong enough to stand on its own two feet without words. The movement must have a rhythm and structure of its own. It must not follow the text. It can reinforce a text without illustrating it. What you hear and what you see are two different layers. When you put them together, you create another texture” (qtd. in Holmberg 136).
Holmberg, Arthur. 1996. The Theatre Of Robert Wilson. Cambridge: Cambridge UP.


Tradução livre

“Palavras são para Bob como tachinhas no chão da cozinha na escuridão da noite e você descalço. Então Bob limpa o caminho para que se possa atravessar as palavras sem se machucar. Bob altera o valor e a forma das palavras. Em alguns casos elas assumem mais sentido; em outros menos.”
“O modo como os atores são treinados aqui é errado. Tudo que se pensa é interpretar o texto. Eles se preocupam a respeito de como falar as palavras e não sabem nada sobre sues corpos. Você vê isso pelo modo como eles caminham. Eles não entendem o peso de um gesto no espaço. Um bom ator pode comandar a platéia movendo um dedo.”
“Eu faço movimentos antes de trabalhar no texto.Depois nós colocamos texto e movimento juntos. Eu faço movimentos primeiro para me certificar que são fortes o suficientes para se sustentar nos próprios pés sem palavras. O movimento dve ter ritmo e estrutura por si só. Não pode seguir o texto. Ele pode reforçar o texto sem ilustrá-lo. O que você ouve e o que você vê são duas camadas distintas. Quando você as une, você cria uma outra textura.
____________
O trabalho com a obra de Bob Wilson partiu de várias frentes de contato: textos da bibliografia indicada, aulas expositivas, pesquisa de mídias na internet, vídeos de obras, a chance de vê-lo se apresentar no SESC Belenzinho com o trabalho Krapp’s last Tape, a confecção de roteiros individuais e coletivos a partir de apropriação crítica de seu trabalho e finalmente um exercício prático onde mais que uma mímese relacionada a trabalhos observados, sua estética e procedimentos foram “devorados”, ou seja, no melhor que o movimento antropofágico tem para ensinar, comemos Bob Wilson.
Gostaria de dividir algumas considerações.
O texto de Hans-Thies Lehmann, Teatro Pós-Dramático, foi para mim fundamental para começar a compreender onde a obra de Wilson se insere, e dado o número de vezes que Lehmann cita e/ou ilustra com o trabalho de Wilson, parece que Wilson alimenta a própria reflexão de Lehmann em relação ao pós-dramático.
Os vídeos e a pesquisa na internet, em especial do próprio site da obra do sr. Wilson
 serviram para se ter uma idéia  visual de tudo o que se lê a respeito de seu trabalho. Finalmente assistir o monólogo Krapp’s Last Tape e ver ao vivo sua estética, e o preciosismo de sua execução foram bastante pedagógicos.
Como um artista que vem da dança e estuda há algum tempo a potencialidade expressiva do corpo: capacidades, possibilidades, limitações, desafios, etc. entrar em contato com o universo de Bob Wilson, principalmente introduzido por Lehman como este lugar onde o texto não ocupa mais a posição principal foi um grande prazer. Parece que a dança e o teatro nunca estiveram tão mesclados.
Em Bob Wilson o trabalho da cena transcende a palavra no seu contexto tradicional. Mesmo quando utiliza texto, na maior parte das vezes sua utilização se dá de uma forma alterada, distinta, significando diferente.
Seu trabalho foca outras áreas do teatro, muitas vezes ligadas aos aspectos visuais como a iluminação que é quase que uma assinatura, o trabalho de corpo, estilizado e grandioso, distante do natural, a cenografia ou a construção cênica.
Em relação ao modo como utiliza o corpo não pude deixar de relacionar com um texto de dança bastante importante.
Na introdução de um livro de Rudolf Laban, O Domínio do Movimento, o autor nos dá um exemplo interessante da potencialidade do movimento, da dança. Ele nos pergunta, depois de estabelecer que um sujeito se move por motivos tangíveis (aparentes) e/ou intangíveis (ocultos), se seria possível a um espectador observar em uma atriz ou bailarina representando Eva no momento em que pega o fruto da Árvore do conhecimento do Bem e do Mal estes dois objetivos: pegar a maçã para comer e ao mesmo tempo adquirir todo o conhecimento do Bem e do Mal. Ele mesmo responde que muito provavelmente não.
Ele dá exemplos de como Eva pega essa maçã: por exemplo vorazmente ou languida e sensualmente. Pois bem, o que se vê de fato em termos de movimento é apenas um agarrar rápido e seco ou um deslizar do braço lento e contínuo. A sensação de voracidade ou languidez quem constrói é o espectador.
Cito Laban para endereçar essa natureza intrínseca do movimento de dizer muito mas não dizer nada exatamente. O movimento é quase como um discurso indomável... sujeito a uma chave que parece ser muito mais da interpretação que da significação e aqui eu estou pensando a partir do texto de Michael Kirby, Por uma performance não-semiótica.
Talvez a palavra possa adquirir uma natureza semelhante quando utilizada em forma poética, metafórica, ou em outras figuras de linguagem. Mas o movimento per se tem essa característica.
Penso que é exatamente nesta potencialidade que Bob se utiliza da linguagem corporal e da dança. Nesta imprecisão natural do discurso do corpo ele pode transbordar leituras, deixa a pergunta no ar ao invés de responder, algo que parece ser também uma marca registrada de seu modo de fazer artístico e sua estética.
De alguma forma, creio que vários dos procedimentos de Wilson, como por exemplo simultaneidade, justaposição e não linearidade, vão na direção daquilo que, de uma certa forma, é próprio da dança e sua “imprecisão de dizer exatamente, mas certamente dizer algo”. Mesmo outras características de sua composição como o estatismo, a câmara lenta, disjunção de voz e ato, são recursos para sair de um lugar tradicional onde a compreensão está condicionada. A minha impressão é que ele deseja em muitas das vezes re-significar, especialmente alguns elementos que são próximos do artista e constantes como o corpo e a voz.
Em Krapp’s Last Tape a cena inicial é longa, talvez cerca de 10 minutos, onde não há nem texto, nem movimento, apenas a projeção de algo que se assemelha a chuva e o som de chuva. Quando ele finalmente se move - e esperamos isso a cada momento, sabemos que a peça não se resume ao estatismo do início ao fim mas como a espera é longa, vamos entrando em outro lugar/estado e quase esquecemos que ele irá se mover... - o movimento tem um valor completamente diferente daquele que aconteceria na seqüência: terceiro sinal, black out, luz/som, movimento. Bob, re-significa aquele primeiro movimento, pequeno e estilizado a partir da imobilidade. Essa percepção foi certamente outra por causa do estudo da obra de Wilson e me pergunto se uma platéia sem algum tipo de estudo sobre o pós-dramático, ou qualquer estudo de artes cênicas que seja chegaria a ser tocada por aquilo. Fico me perguntando se a obra de Wilson chegaria numa platéia sem seu histórico. Sendo sincero, eu nunca pensei que estes 10 minutos de “vácuo” teriam tamanho impacto em mim... 


Clipe

domingo, 3 de junho de 2012

Robert Wilson? Uma sensibilidade poética e uma generosa estética.


Protocolo do Módulo Robert Wilson por Rodrigo Loboda Biondi

Robert Wilson? Perguntei-me quando fui proposto a criar e desenvolver um Roteiro Ideal. Criei e desenvolvi a partir dos meus conceitos, referências, vivências cênicas e do queria naquele momento. Aí está:

                       

                      

Logo que entreguei o Roteiro Ideal ao Professor Marcos Bulhões, sempre com a espera da aprovação ou da rejeição, “conheci” Robert Wilson, assistindo pela primeira vez o documentário Absolute Wilson, de Katharina Otto-Bernstein. “Ufa...” (pensei). A exibição acabou e o professor nos orientou a avaliarmos os nossos roteiros no término do módulo Bob Wilson. Provocando-nos a emparelhar Robert Wilson e todos os seus procedimentos criativos. Que prazer em conhecer um encenador que acredita na luta, também minha, de se construir como artista, encenador e educador.
“Chris não menti!”

“Ator é criador e não reprodutor.”

“Chris em cena? Porque não?”

Robert Wilson, em Absolute Wilson

Perceber um potencial poético e estético no que se pode encarar como simples demais ou até mesmo despercebido. Montar uma paisagem cênica justapondo todas as linguagens da arte, tanto como arte total como simultaneísmo. Propor ao público, ao espectador, a participação, a possibilidade de tornar-se parte da paisagem ou simplesmente admirá-la e relaxar.  Legados que Robert Wilson deixa e se provoca a fazer de maneira madura e legítima, como constatei em suas bem-humoradas histórias, contadas por ele mesmo na abertura da exibição do documentário Absolute Wilson, no CINESESC, São Paulo, SP. O documentário de novo? Porque não?
Aliás, sempre que possível! Ainda com o próprio Robert Wilson apresentando, não pude deixar de vivenciar esse momento propício ao estudo e muito especial.


 


Um presente! Ver e constatar a simplicidade e generosidade de um encenador renomado mundialmente! Mais uma vez Bob Wilson criou uma paisagem. Espero que todos que possam ver a admirem e a recriem; que entendam que o fazer artístico está no querer de um ser humano sensível e não burocrático.

Portanto fomos à prática provocadora nas aulas do Professor Bulhões. Propôs-nos mais dois roteiros cênicos, desta vez a partir dos procedimentos criativos de Bob e de um recorte ou quadro poético e estético de alguma obra do mesmo. E ainda nos ofereceu a oportunidade de expor esses roteiros a todo o grupo que foi subdividido para que criassem um experimento cênico fundamentado em todos os roteiros e conceitos até aqui discutidos. Resultados que geraram discussões e imagens poéticas. Foi aí, que assumi o experimento, também dos meus alunos, “não-atores”. Alunos “especiais” da APAE de Várzea Paulista que experimentaram e experimentam em seus ensaios e performances procedimentos pedagógicos de criação de Bob Wilson, como a simultaneidade, repetição e a dilatação do tempo e do movimento, sempre como performances e não personagens, ou seja, sempre fazendo parte de uma natureza única e não como destaque da mesma. Caminhos para um teatro pós-antropocêntrico e performise (junção das palavras “perfomance” e “mise em scène”, segundo Bernard Dort). Aqui estão alguns experimentos com meus alunos “não-atores”:

                           
                                         Ensaio com alunas da Terceira Idade, abril de 2012


Performance “Água”, maio 2012


Performance “Água”, maio 2012


Performance “Água”, maio 2012


E hoje, no dia em que finalizo o meu protocolo, me deparo com a entrevista de Marina Person comRobert Wilson, veiculada pelo programa Metrópolis da TV CULTURA. Coincidência? Prefiro encarar como uma sincronicidade de Bob Wilson.

Foi um prazer conhecê-lo!

Rodrigo Loboda Biondi




quinta-feira, 24 de maio de 2012

A experiência da forma. por Melissa Panzutti


Protocolo Bob Wilson
Prof. Dr. Marcos Bullhões
Por Melissa Panzutti

O que fiz com Bob Wilson.
A pratica oferecida na metodologia de trabalho da matéria encenação em jogo me fez refletir com o corpo, desafiado por proposições que vão além de estudar os conceitos teóricos mas experimenta-los com o coletivo, nesse sentido que a reverberação dessa vivência em mim eu chamo do que fiz com Bob Wilson. Busco nessas linhas traçar paralelos da pratica experienciada com o conceito do saber da experiência de Jorge Larrosa Bondia enfatizando a capacidade de marcar o corpo e produzir novas subjetividades e os conceitos da estética relacional de Nicolas Bourriaud como suporte para um olhar sobre as formas e ambos como trampolim para a apropriação e questionamento do fazer artístico.

Larrosa destaca uma separação crucial para se debruçar sobre a experiência, diferenciando esta da informação. O saber de estar informado não traz propriamente sabedoria e sim, o poder de opinar e estar a par de algo. A experiência pressupõe que o sujeito da experiência é atravessado pelo saber e esta se dá na relação entre o conhecimento e a vida humana. Essa experiência provoca um saber distinto do saber cientifico e do saber da informação, mas um saber da práxis. Essa práxis que me refiro no processo criativo que passamos com base na experimentação proposta durante quatro encontros sobre o encenador Bob Wilson.

Destaco a proposta pedagógica num conjunto de procedimentos pratico e teóricos como um disparador de diálogos que trouxeram uma apropriação e a reflexão do processo criativo vivenciado. Ao trazer para nossos encontros o conceito de hipertexto como metodologia emergiram uma rede de conexões e associações poéticas e teóricas para que o fluxo criativo pudesse acontecer. Um encontro polifônico sobre B. Wilson. O exercício de experimentação das formas re dimensionou os conceitos discutidos marcando nossos corpos nessa práxis.

Assim trago para a continuidade desse pensamento polifônico, a estética relacional de Nicolas Bourriaud, que expõe uma teoria da forma quando olha o artista e a obra de arte conectados com seu tempo, num jogo cuja forma, modalidades e funções  evoluem conforme épocas e os contextos sociais. Se antes tínhamos a atividade artística ligada a conquista de território pelo proprietário da obra hoje apresenta uma arte que propõe uma discussão ilimitada pois esta vinculada a uma duração a ser experimentada. A forma evidencia-se como elemento de ligação, definida por ele como um encontro fortuito duradouro, uma unidade coerente que apresenta caraterísticas de um mundo, um encontro aleatório em que os elementos se unificam numa forma. O artista contemporâneo coloca-se como fomentador desse encontro e disparador inicial  desse dialogo.


 Para dar conta da encenação pós dramática e contemporânea, nada do que criar um encontro artístico que provoque uma experiência estética onde os conteúdos são experienciados numa práxis do fazer artístico. A forma desses encontros dialogava diretamente com os conceitos estudados. Sendo  forma abordada como:
 “unidade estrutural que imita um mundo. A pratica artística consiste em criar uma forma capaz de durar fazendo com que as entidades heterogêneas se encontrem num plano coerente para produzir uma relação com o mundo”. Bourriaud (2009)

É com esse olhar que as praticas artísticas produzidas fomentaram : a possibilidade de não mais acreditarmos que exista um ponto único de partida para a apropriação do fazer artístico contemporâneo; ressaltou pontos de encontro e convergência onde emergiam a heterogeneidade das subjetividades dos sujeitos envolvidos naquele encontro; e trouxe a perspectiva de que o encontro desses artistas pesquisadores era um encontro artístico, um encontro fortuito e duradouro, onde os elementos de ligação foram vivenciados. Brincamos com a forma. 

Assim faço uma trajetória para exemplificar o que nos acometeu nesse processo criativo e o que eu pude experienciar dele.

Os elementos da escritura cênica.
Num primeiro momento a poética de Bob Wilson foi enunciada pela projeção em uma tela grande ao fundo de um teatro. Com a seguinte consigna: Recorte uma imagem e partir dela crie seu roteiro cênico(aproximando-nos do modo de criação de Wilson).   O documentário “Absolute Wilson”  aguçava nossa percepção pelas imagens , pelo som e em seguida uma discussão foi disparada pela questão : quais os elementos da  escritura cênica utilizados nas encenações de Wilson?

Repertório de referencia comum.
A Pluralidade de imagens, associações e devaneios que os artistas pesquisadores se colocaram diante de tal discussão propõe uma decupagem de possibilidades de escritura. As escrituras ganharam seus respectivos nomes e significados e um repertorio em conjunto de referencias imagética e  poética foi instituído. Assim a proposição de se fazer um Roteiro “A la Bob Wilson” dimensionou a analise da encenação e fomentou a criação individual de cada artista em  sua pessoalidade ao  criar o roteiro utilizando-se do modelo de referência comum.

Compartilhar dos roteiros e aprofundamento.
Num segundo momento, com a percepção ainda mais  aguçada na apreciação de outras encenações dos espetáculos de Bob e o destaque das escrituras cênicas verticalizamos os elementos. Foi nesse contexto que partilhamos os roteiros cênicos.
Novamente a pluralidade da estética relacionada com Bob Wilson, partiam das reflexões sobre a analise das escrituras cênicas. Os elementos de justaposição, disjunção, cena simultânea, dramaturgia da imagem, ação cenográfica, dilatação do tempo e movimento foram exercitados em cada roteiro com sua particularidade de entendimento, sentido e individualidade intrínseca a personalidade de cada artista pesquisador.

Corporeidade.
Continuamos com o terceiro momento, quando experimenta-se a corporeidade do processo a la Bob Wilson. Os corpos, as dinâmicas de movimento, as pausas, os coros, a formalidade, o corpo e seu estado de relaxamento e tensão.  Até agora nos relacionamos a partir dos procedimentos de Wilson com a dimensão intelectual, a imagética, o exercício de escrita e gráfica e o corpo físico.

O corpo reflexivo- perceptivo.
A experiência quando logra acordar os diversos sentidos, abarca uma gama diversa das personalidades envolvidas nessa experiência, isto é, cada individuo tem a possibilidade de a partir dessas percepções criar seu próprio lugar de sentido para uma apropriação. No que se refere a percepção aguçada até então desses artistas pesquisadores, os corpos presentes nesse encontro foram afetados sensorialmente. Na dimensão intelectual, pelas reflexões e referencias bibliográficas, falar, discutir e associar. Na dimensão  visual, na apreciação das imagens e na sonoridade proliferada pela estética de Bob Wilson. Na dimensão desse o corpo motor, no que se refere na materialização das ideias ,ainda que abstratas,  quando roteirizadas e desenhadas nos roteiros cênicos. E na fiscalização de imagens no tempo e espaço.
Algumas questões me inquietam ainda ara uma continuidade de pesquisa. Em que medida o espectador da obra de Wilson também é aguçado perceptivamente nessas dimensões? De que maneira a partir da experiência de assistir o espetáculo de Wilson nosso corpo se encontra em estado reflexivo?

O espaço do encontro.

O quarto momento os grupos escolheram um roteiro cênico a ser materializado propriamente. Para isso cada pesquisador era confrontado com o exercício dos outros e nos grupos, os roteiros foram dialogados.  Desse dialogo recortaríamos 4 a 5 minutos de experimentação poética a la Bob Wilson, a tarefa de selecionar alguns  minutos com as escrituras cênicas presentes nos roteiros se transformou num exercício de desapego e de percepção, um exercício de sim.

Da forma da proposta as escrituras cênicas emergiram.
O caráter do exercício, propunha uma reflexão em ato da escolha sobre a escritura cênica envolvida no roteiro do parceiro e se esta merecia um dialogo, uma justaposição, oposição com as imagens do roteiro do outro. Provocando uma verticalização dos próprios conceitos levantados nas  dimensões de estudo, a experiência corporal, a escritura cênica, a revisitação das imagens e conceitos discutidos nos momentos anteriores. O formato da proposta do exercício coletivo evidenciava exatamente os conceitos abordados anteriormente, as escrituras cênicas emergiam.
A experiência propôs que as imagens fossem  justapostas, as vezes um elemento cênico que já estava acontecendo era deixado de lado para evidenciar outro ainda não enunciado naquele novo roteiro criado. Cada artista, somava a ideia do outro complementando, mas havia critérios muito claros em comum. Os elementos da escritura de Bob Wilson, as percepções vivenciadas em comum por aqueles pesquisadores, o referente se tornou uma massa de manipulação, de decupagem, de corta e cola que possibilitou a criação desse quinto momento.


O grande roteiro “A la Bob Wilson”.
As quatro materialidades dos grupos foram  expostas e  exercitadas, experimentadas com seus figurinos, com sua luz e som. O exercício de ir e vir, tirar antes, colocar depois. E a grande composição de 3 a 4 minutos cada um dos exercícios evidenciou no corpo, o que seria propriamente a encenação de Wilson. Link para os exercicios do grupo 3.

Marcar o corpo.
Não existe evidentemente uma separação entre a teoria e a pratica da encenação. Não só os conteúdos da metodologia de criação de Bob Wilson foram elencados em uma primeira instancia intelectualmente, com os textos e entrevistas sobre, mas a forma que Wilson trabalha foi marcada em cada corpo. Marcada perceptivamente, onde não só os cinco sentidos, mas outros ainda não nomeados, que por associação se agrupam trazendo memorias, disparando sensações.

As relações de imbricamento de forma e conteúdo explicita-se no formato dos encontros e revela os conteúdos da encenação de Wilson. A apropriação dos elementos cênicos que os pesquisadores puderam viver na pele não estariam tão marcados no corpo se o formato do encontro fosse linear, não imagético, não corporal como o trabalho de Wilson. Posso atrever-me a dizer que marcarmos o corpo com as escrituras cênicas analisadas anteriormente.