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quinta-feira, 24 de maio de 2012

A experiência da forma. por Melissa Panzutti


Protocolo Bob Wilson
Prof. Dr. Marcos Bullhões
Por Melissa Panzutti

O que fiz com Bob Wilson.
A pratica oferecida na metodologia de trabalho da matéria encenação em jogo me fez refletir com o corpo, desafiado por proposições que vão além de estudar os conceitos teóricos mas experimenta-los com o coletivo, nesse sentido que a reverberação dessa vivência em mim eu chamo do que fiz com Bob Wilson. Busco nessas linhas traçar paralelos da pratica experienciada com o conceito do saber da experiência de Jorge Larrosa Bondia enfatizando a capacidade de marcar o corpo e produzir novas subjetividades e os conceitos da estética relacional de Nicolas Bourriaud como suporte para um olhar sobre as formas e ambos como trampolim para a apropriação e questionamento do fazer artístico.

Larrosa destaca uma separação crucial para se debruçar sobre a experiência, diferenciando esta da informação. O saber de estar informado não traz propriamente sabedoria e sim, o poder de opinar e estar a par de algo. A experiência pressupõe que o sujeito da experiência é atravessado pelo saber e esta se dá na relação entre o conhecimento e a vida humana. Essa experiência provoca um saber distinto do saber cientifico e do saber da informação, mas um saber da práxis. Essa práxis que me refiro no processo criativo que passamos com base na experimentação proposta durante quatro encontros sobre o encenador Bob Wilson.

Destaco a proposta pedagógica num conjunto de procedimentos pratico e teóricos como um disparador de diálogos que trouxeram uma apropriação e a reflexão do processo criativo vivenciado. Ao trazer para nossos encontros o conceito de hipertexto como metodologia emergiram uma rede de conexões e associações poéticas e teóricas para que o fluxo criativo pudesse acontecer. Um encontro polifônico sobre B. Wilson. O exercício de experimentação das formas re dimensionou os conceitos discutidos marcando nossos corpos nessa práxis.

Assim trago para a continuidade desse pensamento polifônico, a estética relacional de Nicolas Bourriaud, que expõe uma teoria da forma quando olha o artista e a obra de arte conectados com seu tempo, num jogo cuja forma, modalidades e funções  evoluem conforme épocas e os contextos sociais. Se antes tínhamos a atividade artística ligada a conquista de território pelo proprietário da obra hoje apresenta uma arte que propõe uma discussão ilimitada pois esta vinculada a uma duração a ser experimentada. A forma evidencia-se como elemento de ligação, definida por ele como um encontro fortuito duradouro, uma unidade coerente que apresenta caraterísticas de um mundo, um encontro aleatório em que os elementos se unificam numa forma. O artista contemporâneo coloca-se como fomentador desse encontro e disparador inicial  desse dialogo.


 Para dar conta da encenação pós dramática e contemporânea, nada do que criar um encontro artístico que provoque uma experiência estética onde os conteúdos são experienciados numa práxis do fazer artístico. A forma desses encontros dialogava diretamente com os conceitos estudados. Sendo  forma abordada como:
 “unidade estrutural que imita um mundo. A pratica artística consiste em criar uma forma capaz de durar fazendo com que as entidades heterogêneas se encontrem num plano coerente para produzir uma relação com o mundo”. Bourriaud (2009)

É com esse olhar que as praticas artísticas produzidas fomentaram : a possibilidade de não mais acreditarmos que exista um ponto único de partida para a apropriação do fazer artístico contemporâneo; ressaltou pontos de encontro e convergência onde emergiam a heterogeneidade das subjetividades dos sujeitos envolvidos naquele encontro; e trouxe a perspectiva de que o encontro desses artistas pesquisadores era um encontro artístico, um encontro fortuito e duradouro, onde os elementos de ligação foram vivenciados. Brincamos com a forma. 

Assim faço uma trajetória para exemplificar o que nos acometeu nesse processo criativo e o que eu pude experienciar dele.

Os elementos da escritura cênica.
Num primeiro momento a poética de Bob Wilson foi enunciada pela projeção em uma tela grande ao fundo de um teatro. Com a seguinte consigna: Recorte uma imagem e partir dela crie seu roteiro cênico(aproximando-nos do modo de criação de Wilson).   O documentário “Absolute Wilson”  aguçava nossa percepção pelas imagens , pelo som e em seguida uma discussão foi disparada pela questão : quais os elementos da  escritura cênica utilizados nas encenações de Wilson?

Repertório de referencia comum.
A Pluralidade de imagens, associações e devaneios que os artistas pesquisadores se colocaram diante de tal discussão propõe uma decupagem de possibilidades de escritura. As escrituras ganharam seus respectivos nomes e significados e um repertorio em conjunto de referencias imagética e  poética foi instituído. Assim a proposição de se fazer um Roteiro “A la Bob Wilson” dimensionou a analise da encenação e fomentou a criação individual de cada artista em  sua pessoalidade ao  criar o roteiro utilizando-se do modelo de referência comum.

Compartilhar dos roteiros e aprofundamento.
Num segundo momento, com a percepção ainda mais  aguçada na apreciação de outras encenações dos espetáculos de Bob e o destaque das escrituras cênicas verticalizamos os elementos. Foi nesse contexto que partilhamos os roteiros cênicos.
Novamente a pluralidade da estética relacionada com Bob Wilson, partiam das reflexões sobre a analise das escrituras cênicas. Os elementos de justaposição, disjunção, cena simultânea, dramaturgia da imagem, ação cenográfica, dilatação do tempo e movimento foram exercitados em cada roteiro com sua particularidade de entendimento, sentido e individualidade intrínseca a personalidade de cada artista pesquisador.

Corporeidade.
Continuamos com o terceiro momento, quando experimenta-se a corporeidade do processo a la Bob Wilson. Os corpos, as dinâmicas de movimento, as pausas, os coros, a formalidade, o corpo e seu estado de relaxamento e tensão.  Até agora nos relacionamos a partir dos procedimentos de Wilson com a dimensão intelectual, a imagética, o exercício de escrita e gráfica e o corpo físico.

O corpo reflexivo- perceptivo.
A experiência quando logra acordar os diversos sentidos, abarca uma gama diversa das personalidades envolvidas nessa experiência, isto é, cada individuo tem a possibilidade de a partir dessas percepções criar seu próprio lugar de sentido para uma apropriação. No que se refere a percepção aguçada até então desses artistas pesquisadores, os corpos presentes nesse encontro foram afetados sensorialmente. Na dimensão intelectual, pelas reflexões e referencias bibliográficas, falar, discutir e associar. Na dimensão  visual, na apreciação das imagens e na sonoridade proliferada pela estética de Bob Wilson. Na dimensão desse o corpo motor, no que se refere na materialização das ideias ,ainda que abstratas,  quando roteirizadas e desenhadas nos roteiros cênicos. E na fiscalização de imagens no tempo e espaço.
Algumas questões me inquietam ainda ara uma continuidade de pesquisa. Em que medida o espectador da obra de Wilson também é aguçado perceptivamente nessas dimensões? De que maneira a partir da experiência de assistir o espetáculo de Wilson nosso corpo se encontra em estado reflexivo?

O espaço do encontro.

O quarto momento os grupos escolheram um roteiro cênico a ser materializado propriamente. Para isso cada pesquisador era confrontado com o exercício dos outros e nos grupos, os roteiros foram dialogados.  Desse dialogo recortaríamos 4 a 5 minutos de experimentação poética a la Bob Wilson, a tarefa de selecionar alguns  minutos com as escrituras cênicas presentes nos roteiros se transformou num exercício de desapego e de percepção, um exercício de sim.

Da forma da proposta as escrituras cênicas emergiram.
O caráter do exercício, propunha uma reflexão em ato da escolha sobre a escritura cênica envolvida no roteiro do parceiro e se esta merecia um dialogo, uma justaposição, oposição com as imagens do roteiro do outro. Provocando uma verticalização dos próprios conceitos levantados nas  dimensões de estudo, a experiência corporal, a escritura cênica, a revisitação das imagens e conceitos discutidos nos momentos anteriores. O formato da proposta do exercício coletivo evidenciava exatamente os conceitos abordados anteriormente, as escrituras cênicas emergiam.
A experiência propôs que as imagens fossem  justapostas, as vezes um elemento cênico que já estava acontecendo era deixado de lado para evidenciar outro ainda não enunciado naquele novo roteiro criado. Cada artista, somava a ideia do outro complementando, mas havia critérios muito claros em comum. Os elementos da escritura de Bob Wilson, as percepções vivenciadas em comum por aqueles pesquisadores, o referente se tornou uma massa de manipulação, de decupagem, de corta e cola que possibilitou a criação desse quinto momento.


O grande roteiro “A la Bob Wilson”.
As quatro materialidades dos grupos foram  expostas e  exercitadas, experimentadas com seus figurinos, com sua luz e som. O exercício de ir e vir, tirar antes, colocar depois. E a grande composição de 3 a 4 minutos cada um dos exercícios evidenciou no corpo, o que seria propriamente a encenação de Wilson. Link para os exercicios do grupo 3.

Marcar o corpo.
Não existe evidentemente uma separação entre a teoria e a pratica da encenação. Não só os conteúdos da metodologia de criação de Bob Wilson foram elencados em uma primeira instancia intelectualmente, com os textos e entrevistas sobre, mas a forma que Wilson trabalha foi marcada em cada corpo. Marcada perceptivamente, onde não só os cinco sentidos, mas outros ainda não nomeados, que por associação se agrupam trazendo memorias, disparando sensações.

As relações de imbricamento de forma e conteúdo explicita-se no formato dos encontros e revela os conteúdos da encenação de Wilson. A apropriação dos elementos cênicos que os pesquisadores puderam viver na pele não estariam tão marcados no corpo se o formato do encontro fosse linear, não imagético, não corporal como o trabalho de Wilson. Posso atrever-me a dizer que marcarmos o corpo com as escrituras cênicas analisadas anteriormente.

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