Protocolo Bob Wilson
Prof. Dr. Marcos Bullhões
Por Melissa Panzutti
O que fiz com Bob Wilson.
A pratica oferecida na metodologia de trabalho da matéria
encenação em jogo me fez refletir com o corpo, desafiado por proposições que
vão além de estudar os conceitos teóricos mas experimenta-los com o coletivo,
nesse sentido que a reverberação dessa vivência em mim eu chamo do que fiz com
Bob Wilson. Busco nessas linhas traçar paralelos da pratica experienciada com o
conceito do saber da experiência de Jorge Larrosa Bondia enfatizando a
capacidade de marcar o corpo e produzir novas subjetividades e os conceitos da
estética relacional de Nicolas Bourriaud como suporte para um olhar sobre as
formas e ambos como trampolim para a apropriação e questionamento do fazer
artístico.
Larrosa destaca uma separação crucial para se debruçar sobre a
experiência, diferenciando esta da informação. O saber de estar informado não
traz propriamente sabedoria e sim, o poder de opinar e estar a par de algo. A
experiência pressupõe que o sujeito da experiência é atravessado pelo saber e
esta se dá na relação entre o conhecimento e a vida humana. Essa experiência
provoca um saber distinto do saber cientifico e do saber da informação, mas um
saber da práxis. Essa práxis que me refiro no processo criativo que passamos com
base na experimentação proposta durante quatro encontros sobre o encenador Bob
Wilson.
Destaco a proposta pedagógica num conjunto de procedimentos
pratico e teóricos como um disparador de diálogos que trouxeram uma apropriação
e a reflexão do processo criativo vivenciado. Ao trazer para nossos encontros o
conceito de hipertexto como metodologia emergiram uma rede de conexões e
associações poéticas e teóricas para que o fluxo criativo pudesse acontecer. Um
encontro polifônico sobre B. Wilson. O exercício de experimentação das formas
re dimensionou os conceitos discutidos marcando nossos corpos nessa práxis.
Assim trago para a continuidade desse pensamento polifônico, a
estética relacional de Nicolas Bourriaud, que expõe uma teoria da forma quando
olha o artista e a obra de arte conectados com seu tempo, num jogo cuja forma,
modalidades e funções evoluem conforme
épocas e os contextos sociais. Se antes tínhamos a atividade artística ligada a
conquista de território pelo proprietário da obra hoje apresenta uma arte que
propõe uma discussão ilimitada pois esta vinculada a uma duração a ser
experimentada. A forma evidencia-se como elemento de ligação, definida por ele como
um encontro fortuito duradouro, uma unidade coerente que apresenta
caraterísticas de um mundo, um encontro aleatório em que os elementos se
unificam numa forma. O artista contemporâneo coloca-se como fomentador desse
encontro e disparador inicial desse
dialogo.
Para dar conta da
encenação pós dramática e contemporânea, nada do que criar um encontro
artístico que provoque uma experiência estética onde os conteúdos são experienciados
numa práxis do fazer artístico. A forma desses encontros dialogava diretamente
com os conceitos estudados. Sendo forma
abordada como:
“unidade estrutural que imita um mundo. A
pratica artística consiste em criar uma forma capaz de durar fazendo com que as
entidades heterogêneas se encontrem num plano coerente para produzir uma
relação com o mundo”. Bourriaud (2009)
É com esse olhar que as praticas artísticas produzidas fomentaram
: a possibilidade de não mais acreditarmos que exista um ponto único de partida
para a apropriação do fazer artístico contemporâneo; ressaltou pontos de encontro
e convergência onde emergiam a heterogeneidade das subjetividades dos sujeitos
envolvidos naquele encontro; e trouxe a perspectiva de que o encontro desses
artistas pesquisadores era um encontro artístico, um encontro fortuito e
duradouro, onde os elementos de ligação foram vivenciados. Brincamos com a
forma.
Assim faço uma trajetória para exemplificar o que nos acometeu
nesse processo criativo e o que eu pude experienciar dele.
Os elementos da escritura cênica.
Num primeiro momento a poética de Bob Wilson foi enunciada
pela projeção em uma tela grande ao fundo de um teatro. Com a seguinte
consigna: Recorte uma imagem e partir dela crie seu roteiro cênico(aproximando-nos
do modo de criação de Wilson). O
documentário “Absolute Wilson” aguçava
nossa percepção pelas imagens , pelo som e em seguida uma discussão foi
disparada pela questão : quais os elementos da
escritura cênica utilizados nas encenações de Wilson?
Repertório de referencia comum.
A Pluralidade de imagens, associações e devaneios que os
artistas pesquisadores se colocaram diante de tal discussão propõe uma
decupagem de possibilidades de escritura. As escrituras ganharam seus
respectivos nomes e significados e um repertorio em conjunto de referencias
imagética e poética foi instituído. Assim
a proposição de se fazer um Roteiro “A la Bob Wilson” dimensionou a analise da
encenação e fomentou a criação individual de cada artista em sua pessoalidade ao criar o roteiro utilizando-se do modelo de
referência comum.
Compartilhar dos roteiros e aprofundamento.
Num segundo momento, com a percepção ainda mais aguçada na apreciação de outras encenações dos
espetáculos de Bob e o destaque das escrituras cênicas verticalizamos os
elementos. Foi nesse contexto que partilhamos os roteiros cênicos.
Novamente a pluralidade da estética relacionada com Bob
Wilson, partiam das reflexões sobre a analise das escrituras cênicas. Os
elementos de justaposição, disjunção, cena simultânea, dramaturgia da imagem, ação
cenográfica, dilatação do tempo e movimento foram exercitados em cada roteiro
com sua particularidade de entendimento, sentido e individualidade intrínseca a
personalidade de cada artista pesquisador.
Corporeidade.
Continuamos com o terceiro momento, quando experimenta-se a
corporeidade do processo a la Bob Wilson. Os corpos, as dinâmicas de movimento,
as pausas, os coros, a formalidade, o corpo e seu estado de relaxamento e
tensão. Até agora nos relacionamos a
partir dos procedimentos de Wilson com a dimensão intelectual, a imagética, o
exercício de escrita e gráfica e o corpo físico.
O corpo reflexivo- perceptivo.
A experiência quando logra acordar os diversos sentidos,
abarca uma gama diversa das personalidades envolvidas nessa experiência, isto
é, cada individuo tem a possibilidade de a partir dessas percepções criar seu
próprio lugar de sentido para uma apropriação. No que se refere a percepção
aguçada até então desses artistas pesquisadores, os corpos presentes nesse
encontro foram afetados sensorialmente. Na dimensão intelectual, pelas
reflexões e referencias bibliográficas, falar, discutir e associar. Na dimensão
visual, na apreciação das imagens e na
sonoridade proliferada pela estética de Bob Wilson. Na dimensão desse o corpo
motor, no que se refere na materialização das ideias ,ainda que abstratas, quando roteirizadas e desenhadas nos roteiros
cênicos. E na fiscalização de imagens no tempo e espaço.
Algumas questões me inquietam ainda ara uma continuidade de
pesquisa. Em que medida o espectador da obra de Wilson também é aguçado perceptivamente
nessas dimensões? De que maneira a partir da experiência de assistir o espetáculo
de Wilson nosso corpo se encontra em estado reflexivo?
O espaço do encontro.

Da forma da proposta as escrituras cênicas emergiram.
O caráter do exercício,
propunha uma reflexão em ato da escolha sobre a escritura cênica envolvida no
roteiro do parceiro e se esta merecia um dialogo, uma justaposição, oposição
com as imagens do roteiro do outro. Provocando uma verticalização dos próprios
conceitos levantados nas dimensões de
estudo, a experiência corporal, a escritura cênica, a revisitação das imagens e
conceitos discutidos nos momentos anteriores. O formato da proposta do
exercício coletivo evidenciava exatamente os conceitos abordados anteriormente,
as escrituras cênicas emergiam.
A experiência propôs que as imagens fossem justapostas, as vezes um elemento cênico que já
estava acontecendo era deixado de lado para evidenciar outro ainda não
enunciado naquele novo roteiro criado. Cada artista, somava a ideia do outro
complementando, mas havia critérios muito claros em comum. Os elementos da
escritura de Bob Wilson, as percepções vivenciadas em comum por aqueles
pesquisadores, o referente se tornou uma massa de manipulação, de decupagem, de
corta e cola que possibilitou a criação desse quinto momento.
O grande roteiro “A la Bob Wilson”.
As quatro
materialidades dos grupos foram expostas
e exercitadas, experimentadas com seus
figurinos, com sua luz e som. O exercício de ir e vir, tirar antes, colocar
depois. E a grande composição de 3 a 4 minutos cada um dos exercícios evidenciou
no corpo, o que seria propriamente a encenação de Wilson. Link para os exercicios do grupo 3.
Marcar o corpo.
Não existe evidentemente uma separação entre a teoria e a
pratica da encenação. Não só os conteúdos da metodologia de criação de Bob
Wilson foram elencados em uma primeira instancia intelectualmente, com os textos
e entrevistas sobre, mas a forma que Wilson trabalha foi marcada em cada corpo.
Marcada perceptivamente, onde não só os cinco sentidos, mas outros ainda não
nomeados, que por associação se agrupam trazendo memorias, disparando sensações.
As relações de imbricamento
de forma e conteúdo explicita-se no formato dos encontros e revela os
conteúdos da encenação de Wilson. A apropriação dos elementos cênicos que os
pesquisadores puderam viver na pele não estariam tão marcados no corpo se o
formato do encontro fosse linear, não imagético, não corporal como o trabalho
de Wilson. Posso atrever-me a dizer que marcarmos o corpo com as escrituras
cênicas analisadas anteriormente.
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